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Pontes Sobre as Águas

  A manh? estava ensolarada, mas para mim, parecia envolta em sombras.O canto dos pássaros e a brisa leve n?o traziam o conforto de sempre.

  Era como se o mundo ao meu redor insistisse em ser indiferente ao peso que eu carregava.

  A ausência dela era como uma lacuna que eu n?o sabia preencher. Cada risada, cada comentário espirituoso, cada pequena provoca??o que normalmente tornavam nossas manh?s mais leves, agora eram apenas ecos.

  Caminhando para a escola ao lado de Seiji e Rintarou, a falta de Kaori era quase palpável.

  Seiji ainda tentava manter o tom animado, mas mesmo sua energia parecia menos vibrante.

  — Ei, Shin! Já pensou onde a gente vai, hein? Você n?o escapa nem a pau! — Ele empurrou meu ombro com o cotovelo, tentando arrancar uma rea??o.

  — Vou tentar n?o escapar… — murmurei, desviando o olhar para o ch?o, a voz carregada de um esfor?o para soar normal.

  Ele franziu as sobrancelhas, percebendo que algo estava fora do lugar, mas n?o insistiu de imediato.

  Rintarou, no entanto, continuou a caminhar em silêncio ao meu lado, as m?os nos bolsos, mas com aquele olhar avaliador que ele sempre tinha quando entendia algo antes mesmo de ouvir.

  — Kaori ainda n?o voltou, né? — A pergunta veio direta, quase como um soco, quebrando o silêncio.

  Meu cora??o apertou, e meu est?mago revirou como se as palavras dele tivessem despertado o arrependimento que eu tentava ignorar.

  — N?o. — A resposta saiu pesada, como se carregar a culpa tivesse exaurido até minha voz.

  Seiji finalmente parou de caminhar por um momento, virando-se para me encarar, claramente preocupado.

  — Peraí… n?o voltou? — perguntou ele, os olhos arregalados com uma preocupa??o genuína que contrastava com seu habitual tom brincalh?o. — O que aconteceu entre vocês dois? Vocês brigaram ou algo do tipo?

  Suspirei, passando a m?o pelo cabelo, tentando organizar os pensamentos que insistiam em me sobrecarregar.

  — Eu… eu estraguei tudo. Fui um idiota e disse coisas que n?o devia. Foi minha culpa

  Seiji balan?ou a cabe?a, soltando um assobio baixo enquanto esfregava a nuca.

  — Caramba, Shin… e você tá assim sem resolver nada? Precisa consertar isso logo, cara. Kaori é… bem, é Kaori, né?

  O tom dele era direto, mas n?o havia julgamento, só uma preocupa??o sincera.

  Rintarou, sempre mais contido, assentiu levemente, falando com a calma que parecia ser sua marca registrada.

  — Você sabe o que precisa fazer, Shin. Se desculpar. Mas, até lá, se torturar assim só vai dificultar as coisas.

  O silêncio que se seguiu foi preenchido apenas pelo som de nossos passos na cal?ada. As palavras deles ecoavam na minha mente, e a culpa parecia crescer ainda mais.

  Mesmo com toda a dor e frustra??o que sentia, saber que eles acreditavam que eu podia corrigir o que fiz me deu uma fagulha de esperan?a. Ainda assim, era difícil. Mais difícil do que eu gostaria de admitir.

  Chegando à escola, o movimento usual dos alunos indo e vindo parecia um borr?o. Meus passos seguiam pelo corredor em piloto automático, e a energia vibrante que costumava me cercar parecia abafada, quase sufocada pela ausência dela. Era como se algo essencial tivesse sido tirado, deixando um vazio estranho.

  As aulas come?aram, mas estavam longe de ter minha aten??o. Meu caderno permanecia quase intocado, enquanto minha mente vagava entre o peso da culpa e a necessidade urgente de consertar o que fiz. Vez ou outra, olhava pela janela, vendo o movimento das árvores do lado de fora e me perguntando onde ela estava e o que estava pensando.

  O sinal que marcava o fim das aulas chegou mais rápido do que eu esperava. Saí da sala com pressa, seguindo diretamente para o clube, o cora??o apertado pela expectativa de encontrá-la lá. A cada passo, uma mistura de esperan?a e ansiedade crescia dentro de mim, como se a simples possibilidade de vê-la pudesse aliviar a tens?o.

  Mas assim que entrei na sala do clube, a ausência dela foi como um golpe imediato. O espa?o parecia menos vibrante, mais silencioso, como se o brilho característico que ela trazia tivesse desaparecido.

  Respirei fundo, tentando disfar?ar o desapontamento enquanto me aproximava de Takumi, que organizava alguns papéis com seu habitual ar calmo.

  — Ei, Takumi, cadê a Kaori? — perguntei, tentando soar casual, mas minha voz tremia, entregando o nervosismo que eu tentava esconder.

  Takumi ergueu os olhos dos papéis que estava organizando, sua express?o tranquila como sempre, mas com uma leve hesita??o antes de responder.

  — Ela n?o veio hoje...

  Meu cora??o afundou no mesmo instante. N?o era como se eu esperasse uma recep??o calorosa depois do que aconteceu, mas ouvir aquilo me fez perceber o quanto sua ausência era sufocante.

  Mai, sentada ao lado dele, lan?ou-me um olhar que misturava preocupa??o e algo que parecia uma reprova??o branda.

  — Shin… sobre ontem… — Ela come?ou, sua voz mais suave do que o normal, mas hesitou, como se estivesse escolhendo com cuidado as próximas palavras.

  N?o precisei que ela terminasse. O peso da culpa já estava esmagador. Olhei para o ch?o por um momento, tentando reunir coragem antes de erguer a cabe?a e encarar todos no clube.

  — Pessoal… me desculpem pelo que aconteceu ontem! Eu perdi o controle. Disse coisas que nunca deveria ter dito, e vocês n?o mereciam ver aquilo.

  O silêncio que se seguiu parecia interminável, mas ent?o Mai sorriu, um sorriso que tinha mais compreens?o do que repreens?o, embora seu tom carregasse um toque sério.

  — Tá tudo bem, Shin. Todo mundo tem momentos difíceis. Mas você sabe que isso n?o resolve tudo, né? Você precisa se desculpar com a Kaori. N?o só com palavras, mas de verdade.

  Seus olhos buscaram os meus, firmes, mas gentis. Assenti devagar, sentindo o peso das palavras dela como um lembrete do que eu sabia que precisava fazer.

  — Eu sei… e vou fazer isso. Prometo.

  Rintarou, Takumi, e até Taro, me olharam em silêncio, mas suas express?es suavizaram. Takumi assentiu levemente, voltando ao trabalho, enquanto Mai relaxava na cadeira, embora seus olhos ainda carregassem um pouco de preocupa??o.

  — Boa sorte com isso — disse ela, em um tom mais leve, quase brincalh?o, mas que ainda trazia sinceridade.

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  O clima no clube parecia um pouco menos tenso depois disso, mas a ausência de Kaori era como uma lacuna que ninguém podia preencher. A energia vibrante que ela trazia, suas brincadeiras, até mesmo suas ideias caóticas… tudo fazia falta, e o silêncio só tornava isso ainda mais óbvio.

  Sentado em minha cadeira, olhei para as anota??es na minha frente, mas elas pareciam um borr?o, incapazes de prender minha aten??o. Eu deveria estar pensando no final da minha história, mas antes disso, eu sabia que havia apenas uma coisa que realmente precisava ser feita.

  Enquanto vagava pelos corredores para sair, ainda preso nos meus pensamentos, avistei Yuki carregando algumas caixas grandes. A maneira como ela se inclinava ligeiramente para equilibrar o peso me fez perceber que ela estava tendo dificuldade.

  Sem pensar muito, me aproximei.

  — Precisa de ajuda? — perguntei, já estendendo as m?os para pegar algumas das caixas.

  Ela me olhou surpresa, mas o sorriso que surgiu em seu rosto era cheio de gratid?o.

  — Ah, obrigada, Shin. Essas caixas est?o indo para o depósito da educa??o física.

  Peguei duas delas, e come?amos a caminhar lado a lado. O som de nossos passos preenchia o corredor, mas o silêncio parecia mais carregado de coisas n?o ditas do que tranquilo.

  Yuki, perceptiva como sempre, foi quem quebrou o silêncio.

  — Você tá diferente hoje. Parece… triste. Tá tudo bem?

  Olhei para ela de relance, hesitando por um momento. N?o era exatamente algo que eu queria compartilhar, principalmente com ela, mas… talvez falar com alguém que n?o estava diretamente envolvido ajudasse.

  — Eu… machuquei alguém que é importante pra mim. Disse coisas que n?o devia, e agora essa pessoa tá me evitando.

  Ela parou por um instante, ajustando o peso das caixas que carregava, e olhou para mim com uma express?o gentil.

  — Já tentou falar com essa pessoa? Pedir desculpas?

  Soltei um suspiro, sentindo o peso da culpa voltar a apertar.

  — Quero fazer isso. Preciso fazer isso. Mas… e se essa pessoa n?o me perdoar?

  Yuki ficou em silêncio por alguns segundos, pensando antes de responder. Quando falou, sua voz era calma, mas carregada de uma sinceridade que parecia atingir direto o cora??o.

  — Talvez n?o perdoe na hora. Isso pode levar tempo. Mas, se você for sincero e mostrar que realmente sente muito, as chances s?o bem maiores. Desculpas n?o precisam ser perfeitas, Shin. Só precisam ser verdadeiras.

  As palavras dela ecoaram na minha mente, simples e diretas, mas de um jeito que parecia iluminar algo que eu n?o tinha percebido antes.

  — Obrigado, Yuki. Acho que era isso que eu precisava ouvir.

  Ela sorriu levemente, e quando chegamos ao depósito, colocou as caixas no ch?o e virou-se para mim.

  — às vezes, é difícil admitir quando erramos, mas isso também mostra o quanto nos importamos. Tenho certeza de que vai dar tudo certo.

  Assenti, sentindo um pouco mais de confian?a surgir.

  — Obrigado mesmo. Sério.

  Ela acenou com a cabe?a, e, ao trocarmos um último sorriso, senti como se a carga em meus ombros tivesse ficado um pouco mais leve.

  Enquanto eu me afastava, as palavras dela continuavam ecoando na minha mente, como um lembrete de que a sinceridade era a chave para corrigir o que havia feito.

  Após sair da escola, ainda sem conseguir me concentrar em nada, decidi andar sem rumo. Minhas pernas me levaram por ruas familiares, mas minha mente estava perdida, ainda afundada em culpa e arrependimento.

  Quando percebi, estava perto de um rio.

  O céu alaranjado pintava a água com tons quentes, criando uma cena tranquila, quase como uma pintura. Mas dentro de mim, tudo ainda estava um caos. O som da água corrente parecia amplificar a inquieta??o no meu peito.

  Foi ent?o que a vi.

  Kaori estava sentada na grama, o rosto virado para o rio, e a express?o dela era diferente. Quieta, distante, como se estivesse num mundo próprio. Meu cora??o disparou, e meus passos pararam por um instante.

  Por um breve segundo, pensei em recuar. E se eu piorasse as coisas? Mas ent?o as palavras de Yuki e Mai vieram à mente: as desculpas precisam vir do cora??o.

  Respirei fundo e me aproximei de onde ela estava.

  — Kaori… — chamei, a voz tremendo levemente, quase abafada pelo som do rio.

  Ela n?o respondeu, nem se moveu. Seus olhos continuavam fixos na água. A hesita??o dentro de mim cresceu, mas continuei.

  Sentei-me ao lado dela, sentindo a tens?o quase palpável no ar. Cada segundo de silêncio parecia mais longo do que o anterior.

  Por fim, incapaz de suportar aquilo, levantei-me e me curvei profundamente, as m?os ao lado do corpo, como se toda minha sinceridade precisasse ser traduzida naquele gesto.

  — Desculpa, Kaori! Eu fui um completo idiota! — Minha voz saiu alta, quase desesperada, enquanto eu lutava para manter o tom firme. — Eu… eu estava t?o pressionado com o concurso, com o prazo… tudo parecia demais, e eu acabei descontando em você.

  Ela continuou em silêncio, mas eu sabia que precisava continuar, mesmo que fosse só para colocar tudo para fora.

  — N?o foi sua culpa. Você só queria ajudar, e eu… eu explodi com você. Isso foi horrível da minha parte. Eu sinto muito, de verdade.

  O peso das palavras parecia me esmagar, mas ainda n?o era tudo.

  — Eu tive um pesadelo ontem. — Minha voz tremeu ao admitir isso, mas eu sabia que precisava ser honesto. — No sonho, eu perdi o concurso. Ryuuji me humilhou, e… e todos vocês ficaram desapontados comigo. A ideia de falhar, de decepcionar todo mundo que acredita em mim… isso tem me deixado aterrorizado.

  Levantei a cabe?a, mas ela ainda estava olhando para o rio, o rosto parcialmente escondido pelo cabelo.

  Meu cora??o apertou.

  — Eu entendo se você n?o quiser me perdoar. Mas eu precisava dizer isso. Eu sinto muito, Kaori.

  Por um momento, o silêncio foi absoluto. O som do rio parecia mais alto do que nunca, e eu me senti pequeno, insignificante. Mas ent?o, lentamente, ela virou a cabe?a.

  Sem olhar diretamente para mim, Kaori estendeu a m?o, o bra?o relaxado, mas com o gesto decidido.

  — Barra de chocolate. E um p?o doce.

  — H?? — perguntei, confuso, endireitando-me.

  Ela finalmente virou o rosto para mim, e um pequeno sorriso come?ou a se formar, iluminando sua express?o.

  — Eu só aceito suas desculpas se você me trouxer uma barra de chocolate e um p?o doce.

  Por um segundo, fiquei congelado, sem saber se ela estava falando sério. Mas ent?o percebi o tom brincalh?o na voz dela, e o peso no meu peito come?ou a diminuir, como se um raio de luz tivesse atravessado as nuvens.

  — Tá… tá bom! Eu vou procurar uma loja agora! — disse, já olhando ao redor, quase entrando no modo de miss?o.

  — Ei, espera. — Ela segurou meu bra?o, e o toque leve dela me trouxe de volta. — T? brincando, Shin.

  Ela suspirou, e o sorriso agora era genuíno, cheio de calor.

  — Eu aceito suas desculpas. Você foi um idiota, sim, mas acho que eu também exagerei um pouco. Eu n?o sabia... o quanto você tava passando por tudo isso.

  Senti o alívio se espalhar pelo meu corpo, como se o peso que eu carregava nos últimos dias tivesse finalmente desaparecido.

  — Obrigado, Kaori. Sério. Obrigado.

  Ela se levantou, limpando a grama da saia, e me deu um leve empurr?o no bra?o.

  — Mas, da próxima vez, tenta conversar antes de explodir, tá? N?o sou t?o boa assim pra lidar com dramas.

  — Prometo que vou tentar — sorri genuinamente, sentindo a leveza voltar.

  Enquanto caminhávamos de volta para casa, uma ideia surgiu de repente. Pedi que ela esperasse por um instante e corri até uma loja de conveniência na esquina. Voltei logo depois, segurando uma barra de chocolate e um p?o doce, com um sorriso no rosto.

  — Aqui — estendi os itens para ela, ainda ofegante pela corrida.

  Ela me olhou surpresa, os olhos brilhando em meio à luz alaranjada do final de tarde.

  — Shin… eu tava brincando. Você n?o precisava levar isso a sério.

  — Eu sei. Mas eu quis. — Dei de ombros, um sorriso sincero escapando.

  Ela segurou a barra de chocolate por um momento, mas, com um gesto simples, estendeu o p?o doce de volta para mim.

  — Ent?o vamos dividir.

  Sentamos em um banco próximo, o céu já come?ando a ganhar os primeiros tons de azul escuro. Compartilhamos os doces em silêncio, um daqueles silêncios confortáveis que só s?o possíveis entre pessoas próximas. Cada mordida parecia dissolver o peso dos últimos dias, e eu sentia a tens?o finalmente dar lugar a algo mais leve, mais tranquilo.

  Quando terminamos, Kaori limpou as migalhas das m?os e se levantou, esticando os bra?os como se quisesse afastar os últimos resquícios de tens?o.

  — Tá bom, Shin. Agora você tá oficialmente perdoado. — Sua voz tinha aquele tom brincalh?o de sempre, mas havia algo mais profundo em seu sorriso, algo que falava de compreens?o e alívio.

  Eu sorri de volta, sentindo a sinceridade nas palavras dela.

  — Valeu, Kaori. Prometo que vou fazer melhor daqui pra frente.

  — Espero que sim. — Ela cruzou os bra?os, fingindo uma express?o severa, antes de dar um pequeno empurr?o no meu ombro.

  Rimos juntos, e enquanto come?ávamos a caminhar lado a lado, o mundo parecia ter voltado ao lugar certo.

  O caminho para casa nunca pareceu t?o curto. O peso que carreguei nos últimos dias finalmente parecia ter sumido, e a companhia dela, t?o cheia de vida e energia, era como um lembrete de que as coisas sempre podem ser consertadas.

  Quando chegamos à rua onde morávamos, ela parou e olhou para mim, o olhar iluminado pelas luzes da rua que acabavam de acender.

  — Sabe, Shin… mesmo quando você é um idiota, dá pra perceber que você se importa.

  Eu ri, co?ando a nuca.

  — Vou tentar ser menos idiota da próxima vez.

  Ela revirou os olhos, mas sorriu.

  — Boa noite. E n?o se esquece: agora que você tá perdoado, quero ver um final incrível pra sua história!

  — Pode deixar — assenti, sentindo um calor confortável no peito enquanto ela seguia para casa.

  Fiquei parado por um momento, olhando enquanto ela entrava dentro de sua casa. O céu agora estava completamente escuro, mas, pela primeira vez em dias, eu me sentia em paz.

  Subi as escadas para o meu quarto, peguei minhas anota??es e as espalhei na mesa. Respirei fundo, sentindo que finalmente poderia voltar a escrever com clareza.

  — Certo… vamos recome?ar.

  E assim, com a mente mais leve e o cora??o mais firme, voltei a me concentrar no final da história que tanto significava para mim.

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