Graco escutou com demasiada aten??o toda a história de sua família, sem tirar os olhos por um segundo dos rostos de seu pai e tio. As revela??es sobre este sobrenome finalmente o atingiram.
Todos est?o olhando para diferentes locais. Graco para as express?es de todos, e os outros para a água da banheira, relembrando o passado, associando com o presente, e temendo o futuro.
Eztli e ele sempre suspeitaram de algo trágico do passado. Boa parte de sua infancia foi naquele quarto, e ele gostava, porém, ele foi mantido naquele quarto como uma forma de medida de seguran?a. E ele só foi conhecer seus dois irm?os quase um ano depois de nascer.
Os rostos de seu pai e tio continham as tristezas e fúrias do passado, eles tentam deixar as águas para trás e renascer entre as ruínas, pois ao relembrar o passado apenas veem o que lhes foi tirado. A trilha de passos nessa estrada traz arrependimentos e remorsos.
Após o término desta história, a quietude do ambiente se torna inquietante. Graco vira seu olhar para seu irm?o, que atualmente persiste em segurar pequenas lágrimas teimosas.
Graco n?o sabe o que realmente seu irm?o está sentindo, pode ser a tristeza de ter perdido parentes, ou por ser uma história triste. Rualovu é somente uma crian?a ingênua, que possivelmente está encarando o peso de seu sobrenome.
Eztli e Graco n?o sabem o que falar, os dois est?o at?nitos. A paz e tranquilidade que possuem é o pre?o oriundo de sacrifícios para proteger.
'Graco, seu ...'
Eztli é interrompida, pois ela e Graco captam em sua vis?o periférica um fen?meno macabro.
No fundo desta sala de banho, uma figura escura como breu se ergue vagamente no ch?o, elevando-se até chegar a quase 2m de altura. O formato de um sorriso perverso de dentes imaculadamente brancos estampa o rosto da criatura de um breu absoluto.
Ela se mantém estática enquanto observa este marco na vida de Graco. Somente ele e Eztli o enxergam, mas isso n?o diminui a tens?o da pós prosa histórica.
Uma voz gutural e nefasta, como uma melodia funesta, oscilando entre o tom de uma crian?a e um velho. A arrogancia provocante e manipuladora escorre entre as palavras ardilosas e calculadas, o deboche é o objetivo.
''A diferen?a entre os seres humanos e os animais, é que os animais jamais permitiriam que um estúpido como seus av?s estivessem na lideran?a da manada''
Vendo e ouvindo esta profana??o, Graco serra os dentes em raiva mal contida, seus punhos se apertam como prensas furiosas. Tendo recebido sua rea??o desejada, a escurid?o da Entidade vai se esvaindo em fuma?a até desaparecer.
Eztli vê que Graco está irritado, mas n?o perdendo a cabe?a, ela sabe que isto é somente uma instiga??o vil, e isso a faz apenas abra?ar a alma melancólica de Graco.
A gargantilha de Graco está escondida, mas a tatuagem de seu cora??o no pesco?o n?o. E ela age nesse momento, emanando uma luz gasosa suave e amigável, que entra nas narinas e boca de Graco, como uma droga ela se instala em seu corpo.
Ela se expande como uma confortável névoa translúcida.
Subitamente, Graco e Eztli sentem uma batida como um tambor ecoando em suas almas, elas vibram em respostas e como um som de clique, a vis?o de Graco treme e emba?a em confirma??o, a tatuagem em seu pesco?o alastra uma coceira e cócega por todo o corpo.
Em um piscar de olhos, ele está vendo Vermuthi e Moíah tendo um fio branco imaculado esvoa?ante conectado a seus corpos.
Piscando algumas vezes para reconfirmar a possível chance de ser uma alucina??o, Graco ganha a no??o que é o efeito do cora??o tatuado.
Ele deseja tocar este cord?o imperceptível a todos, e como uma serpente, o cord?o de seu pai se move cautelosamente até tocar o ombro de Graco.
Eztli e ele, abruptamente e simultaneamente, s?o assaltados por sentimentos fervorosos por fra??es de segundos, levando Graco fechar os olhos com for?a. Apenas para n?o encontrar a escurid?o usual do fechar de olhos.
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A raiva, culpa, remorso, angústia e vergonha estalaram como chicote em suas consciências, e logo depois se afastaram para formar um emaranhado de fios e cord?es trêmulos e selvagens em suas imagina??es.
De olhos fechados e observando os fios, inconscientemente Graco é guiado. Com uma vontade imaterial e espiritual, ele puxa um dos fios cuidadosamente. Instintivamente ele sabe que este fio é a raiva de seu pai, e Graco, para fins experimentais, puxa levemente este fio.
Abrindo os olhos, ele vê o fio pelo ar, o fio conectado a seu pai. Vermuthi agora está com uma express?o ainda mais dura, e isso faz ele soltar o fio em sua mente.
A express?o dele suaviza lentamente, mas mantém o semblante firme. Com Moíah, Graco intuitivamente tenta estimular as emo??es de remorso, tocando levemente o fio em sua mente, a rea??o é desenvolvida vagarosamente.
Moíah vai se encolhendo aos poucos, até estar de cabe?a e ombros baixos, Graco solta a cordinha após ter o insight. Testando tudo, Graco têm olhos curiosos e insensíveis.
Virando seu olhar para Rualovu, o fio dele toca sua clavícula e instantaneamente Graco e Eztli s?o recebidos com tristeza, pena, medo e raiva.
Graco n?o se intromete nas emo??es do garoto, tanto por ter a percep??o de estar sendo indiferente com quem gosta e por Rualovu ser uma crian?a.
Graco e Eztli ficam pasmos por alguns segundos, a cadeia de eventos está os deixando surpresos a cada segundo.
'Essa é a Sinecura de Kovskaya?'
Graco se pergunta incerto
'Combina com o seu lado cínico, n?o acha? A calibragem de emo??es e sentimentos, quero dizer.'
No tempo de testar as nuances desta Sinecura, Eztli dá sua opini?o, porém um rebote avassalador agride o espelho esférico de Graco, como se estivesse cobrando o pre?o do servi?o.
Uma sensa??o de usurpa??o atinge Eztli, assustando-a com tal vontade e expulsando sua alma da dele, ela tenta agir rapidamente, mas é impedida por uma for?a invisível.
Ela com medo vai ver rapidamente o Palácio Existencial de Graco, e assisti nervosa o Espelho Esférico ir lentamente parando de rotar, porém ainda emite a aura cristalina.
Em menos de um segundo, a vis?o de Graco sofre um apag?o, a sensa??o da água na pele é exterminada, o sabor da fuma?a do banho some, os sons do vapor e do remexer dos corpos é extinto, o aroma das essências e sabonetes desaparece.
Um pux?o agressivo é jogado na existência de Graco, como se tivesse sido arrastado e jogado em um vazio desumano, em uma caixa. Ele n?o sente mais seus membros, sua voz é cortada e sua percep??o de tempo ou espa?o s?o desativados e aniquilados.
O desespero é despertado, mas logo é pulverizado pelo nada.
Graco sente que está faltando algo dentro de si, como se uma pe?a fundamental de seu ser fosse retirada à for?a.
No entanto, seus pensamentos est?o em uma vacuidade, limpo de qualquer dilema ou lacunas, como se fosse uma máquina, ele está vago e efêmero.
A sua apatia frequente era como o oposto de ter emo??es, era se aproximar de n?o a tê-las ou estar em uma escassez delas, como se estivesse atrofiado e em decadência. No entanto, neste momento, era como ter sido amputado desta faculdade neurobiológica.
Como se fosse oco, simplesmente uma casca, Graco, sente nada, simplesmente a inércia existencial. O puro vácuo, como se estivesse desabitado, ter se tornado um animal biologicamente sem sentimentos e emo??es.
Ele tenta colocar sua mente em foco, até perceber que suas emo??es e sentimentos est?o desaparecidos, até achar normal n?o os ter.
Tenta imaginá-los e fracassa miseravelmente, algo t?o intrínseco e primordial, da natureza humana, a mais pura das express?es da evolu??o, algo t?o primitivo e inerente, é impossível de descrever e imaginar.
Como um rob?, ele pensa sem interferências, sem nada, sem influências internas e externas, ele se sente livre, como se a própria existência fosse uma pris?o, uma paz inexplicável surge.
Ele n?o precisa controlar as rédeas neuroquímicas psicológicas, pois simplesmente se tornou inóspito de tal capacidade, como se parte do cérebro responsável por isso desaparecesse, ou parasse de funcionar.
Após alguns segundos de introspec??o, ele sente que está vazio de humanidade. Ele foi amputado de qualquer sensa??o, física ou mental.
Pensar e existir se tornou inútil, algo desnecessário, sem sentido ou raz?o, uma perda de tempo, todo o seu ser e existência se tornou fugaz e frívolo, é fútil e nulo.
Sem vontades, desejos ou qualquer coisa humana, Graco vai se esvaindo na banheira como uma marionete liberada por seu manipulador, seu semblante é o de um cadáver, inanimado e fosco, e sua express?o é banhada em inexpressividade desalmada, como o de uma boneca de porcelana.
'Graco, o que houve? GRACO, PORRA, GRACO'
Eztli come?a a berrar e gritar na mente de seu parceiro, ela chora em desespero, agonia e preocupa??o. Ela n?o sente nada dele, a fuma?a da alma de Graco se fechou e se reuniu como uma placenta, um útero.
Ela n?o pode fazer nada, ela se sentir inútil é eufemismo neste momento de fraqueza abrupta.
Isso até a escurid?o surgir sorrateiramente e tentar deturpar a alma de Graco, no mesmo instante que ela sente a aura maligna, Eztli avan?a em um ímpeto animalesco, um voraz conflito de alma e energia entre defesa e ataque se inicia.
Sem ela perceber, todo o corpo de Graco fica ainda mais plástico e artificial.
Meros segundos, fez Graco se transformar em um fantoche organico.
''Filho, contei esta história, pois quero lhe ensinar que ...''
As falas de Vermuthi é paralisadas por deixar de olhar para a água transparente da banheira e levar seu olhar para seu filho.
Vermuthi vê seu filho, inerte e imóvel como um brinquedo quebrado, de olhos desfocados e boca aberta ao vento, membros caídos e afundando sem rea??o, sem demonstrar um pingo de vida.
Ele se levanta em um piscar de olhos e se joga em Graco, o erguendo e tirando-o da banheira como um boneco de pano. Isso assusta Moíah e Rualovu, os dois seguem Vermuthi, que agora deitou Graco no ch?o de azulejo úmido e está ajoelhado ao seu lado.
''O que houve com meu irm?o?''
Rualovu exasperado e aterrorizado pergunta enquanto olha para seu irm?o paralisado.
''N?o se preocupe, Uvu. Moíah traga as toalhas.''
Vermuthi tranquilizou Uvu, porém nem ele entende a situa??o, ele tenta manter a calma diante de seu filho. Ele aperta os dentes e prende a respira??o alarmado, seus olhos ficam molhados quase no mesmo momento.
Moíah sente um aperto irreprimível em seu peito, ele vê Graco neste estado e n?o consegue exibir rea??o, ele apenas segue a ordem rígida de Vermuthi e vai pegar as toalhas a menos de 2 metros.
Vermuthi invade o corpo de Graco com sua energia, e isso faz ele sentir um buraco enorme em seu peito, como se estivesse caindo em um abismo. Graco n?o tem batimentos ou respirar, a energia vital dele está inativa.
Vermuthi se desespera, suas m?os come?am a tremer e seus olhos antes marejados agora liberam pérolas grossas.
Uma culpa agonizante mergulha seu ser, ele nem sabe o motivo de Graco cair neste estado, seu cérebro apenas corre em busca de respostas e a única que encontra é que segundos após terminar de contar a história acontece isso.
Moíah mal se vira após agarrar as toalhas, e vê a cena traumatizante, seu cora??o afunda, fazendo-o se ajoelhar ao lado do garoto. Lágrimas secas se prendem aos olhos ardidos, o sentimento de luto o inunda.
Rualovu neste momento está chorando e berrando, ele mesmo nunca tendo visto, sabe por instinto que está placidez de Graco n?o é normal, somados as rea??es de seu pai e tio, ele grava a imagem em pedra em sua mente desta cena.