Como a anterior, esta investiga??o come?ou num fórum online que falava do avistamento de estranhas luzes, desta vez na Citania de Briteiros. Contudo, estava também associada às Bruxas da Noite e ao diário, pois uma das entradas deste reunia várias histórias captadas em segunda m?o que contavam que bruxas poderosas habitavam entre as ruínas, escondidas. O meu antecessor, tímido como parecia ser, nunca tentou confirmar essas histórias, mas a existência destas e das luzes pareciam mais do que coincidência, e eu tinha de investigar.
Uma noite, após o trabalho, telefonei à minha mulher para lhe dizer que ia trabalhar até tarde e, depois, encaminhei-me para a citania. Esta n?o ficava longe do meu emprego, porém, parte da estrada era muito exígua, com muitas curvas de pouca visibilidade, pelo que requeria uma condu??o cuidada. Como tal, demorei mais de meia hora a lá chegar.
Estacionei num pequeno espa?o de terra batida ao lado da estrada, em frente da entrada da citania. Embora ainda n?o fosse noite, já come?ara a anoitecer, e esta encontrava-se fechada. Decidi aproveitar o pouco de luz que ainda restava para procurar outra forma de entrar.
Percorri quase todo o perímetro das ruínas virado para a estrada. Finalmente, uma centena de metros abaixo de onde deixei o carro, encontrei um espa?o entre a rede e o ch?o grande o suficiente para eu passar. Arrastando-me de costas e empurrando a rede para cima, consegui entrar.
Estava, agora, junto das ruínas de uns banhos situados num dos pontos mais baixos da citania. Mesmo com a escurid?o crescente e intento em descobrir as origens das luzes, n?o consegui deixar de admirar a chamada Pedra Formosa dos banhos, gravada com motivos celtas.
Comecei a subir uma ancestral rua, a mesma que os habitantes da idade do ferro usavam no seu dia-a-dia, ladeada por uma conduta que levava água aos banhos. A subida n?o foi fácil, pois a cal?ada era irregular e bastante íngreme, mas, por fim, cheguei à zona onde se concentravam a maior parte das ruínas de casas.
Depois de descansar um pouco, decidi continuar a subir até ao topo da acrópole. Sendo o ponto mais alto da citania, era o local ideal para ficar de vigia e avistar as luzes que ali fui procurar.
Subi por outro dos caminhos originais. Este serpenteava por entre as ruínas dos vários complexos familiares, em que casas circulares construídas em volta de um terreiro central se encontravam envoltas por uma parede mais alta do que eu.
Passei, também, junto da muralha mais interior e do seu port?o norte. Apesar de, na escurid?o, n?o as conseguir ver, sabia que, gra?as a uma minha visita anterior, havia mais duas muralhas além desta.
Finalmente, cheguei ao topo da acrópole. Para além de duas casas reconstruídas, havia ali as ruínas de um enorme edifício redondo com bancos de pedra adossados à parede. Segundo as leituras que fiz antes da minha visita anterior à citania, os arqueólogos pensavam tratar-se da casa onde os governantes ou os anci?os se juntavam para discutir e resolver os problemas da povoa??o.
Dali, conseguia ver toda a citania, porém, n?o detetei nenhum sinal das luzes de que os rumores falavam. Todavia, ainda era cedo, pelo que me encostei a uma das casas reconstruídas e esperei. Só queria que aquela n?o fosse uma das poucas noites sem ocorrências daquele mês.
O primeiro sinal de que algo iria acontecer, porém, n?o foi o aparecimento de luzes, mas sim de vultos que se mexiam mais abaixo, na escurid?o. Estes surgiram de um ponto quase oposto àquele por onde eu havia entrado, pelo que me perguntei como tinham atravessado a veda??o.
Lentamente, aproximaram-se do pequeno terreiro entre os complexos familiares, mais abaixo, foi ent?o que, gra?as à luz da Lua e das estrelas, me apercebi de que se tratavam de cinco mulheres vestidas de negro. A ideia de que podiam ser as Bruxas da Noite passou-me pela cabe?a, mas logo a descartei. Estas mulheres n?o tinham as caras cobertas nem a envergadura das criaturas que eu procurava.
Foi ent?o que as luzes que me levaram ali apareceram. Vi-as, primeiro, como três pequenas chamas esverdeadas num pequeno arvoredo junto ao exterior do perímetro da citania. Porém, rapidamente se aproximaram, ao mesmo tempo que aumentavam de tamanho e intensidade.
Ao vê-las, as cinco mulheres procuraram imediatamente refúgio por entre as ruínas. Esperaram que os fogos-fátuos se aproximassem mais um pouco, e, ent?o, come?aram a recitar estranhos e elaborados canticos. Para minha surpresa, instantes depois, uma torrente de granizo abateu-se sobre as chamas viventes, apesar de o céu estar limpo. Em meros segundos, estas e o terreno em redor estavam cobertos por um monte de gelo.
Até ao momento, n?o tinha visto uma tal demonstra??o de poder por parte de nenhuma bruxa, pelo que, por momentos, me perguntei se aquelas cinco mulheres n?o seriam mesmo as Bruxas da Noite.
As atacantes esperaram um pouco para se certificarem que tinham, realmente, neutralizado o seu alvo. O monte de gelo n?o se moveu, e elas, saíram, ent?o, dos seus esconderijos.
- Conseguimos - disse uma delas. - Agora somos as bruxas mais poderosas do norte de Portugal.
- Parece que sim - concordou outra, com um sorriso nos lábios.
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- Têm a certeza? - perguntou uma terceira, olhando, desconfiada e amedrontada, para a pilha de granizo. - Elas já sobreviveram a pior.
- De certeza - afirmou a primeira. - Foi desta que descobrimos a fraqueza delas.
Nesse instante, o monte de gelo come?ou a estremecer. Uns segundos depois, com uma explos?o, os fogos-fátuos emergiram do granizo.
As invasoras correram de volta para os seus refúgios e come?aram um novo cantico. Porém, desta vez, os seus oponentes entraram em a??o.
Com uma rapidez incrível, um deles chocou contra uma das bruxas, projetando-a vários metros para trás. Outro disparou um estranho relampago esverdeado que contornou a cobertura e atingiu a atacante atrás dela. Depois, os três juntaram-se e come?aram a mover-se rapidamente em círculo. Uma chuva de pequenas esferas de chamas verdes abateu-se, ent?o, sobre as três invasoras ainda em combate. Mal tocaram as suas roupas, incendiaram-nas, embora, ao atingir o solo, se apagassem instantaneamente, sem sequer queimarem a vegeta??o.
As atacantes rebolaram pelo ch?o para extinguir as chamas. Quando se voltaram a levantar, decidiram admitir a derrota e, depois de pegarem nas suas duas amigas inconscientes (ou talvez mortas), fugiram até desaparecerem na escurid?o de onde tinham surgido.
Os fogos-fátuos permaneceram imóveis durante mais alguns minutos. Eu fiquei onde estava, a observá-los, na esperan?a que, ao irem embora, me levassem a algo que indicasse a sua origem. Afinal, as mulheres que haviam enfrentado eram claramente bruxas. Será que eles n?o teriam alguma rela??o com as Bruxas da Noite?
A verdade prontamente se revelou e apanhou-me completamente de surpresa.
As chamas dos fogos-fátuos come?aram a agitar-se e a crescer. De repente, desapareceram por completo, revelando três pessoas: duas mulheres e um homem.
- Espero que este seja o último destes ataques - disse o homem. - Correr com estas bruxas de segunda está a tornar-se aborrecido.
- é o pre?o da fama - respondeu uma das mulheres.
- Mas que pretendem elas com isto? - perguntou a outra mulher. - Ocupar o nosso lugar? Acham que derrotarmos lhes vai dar o nosso poder?
Claramente, aquelas pessoas eram bruxas poderosas. Porém, n?o tinham o tamanho nem as vestimentas das Bruxas da Noite, pelo que assumi n?o serem elas. Além disso, estas últimas dificilmente podiam ser chamadas de famosas. Contudo, talvez estas três soubessem de alguma coisa que me pudesse ajudar.
Respirei fundo para reunir coragem antes de, mais uma vez, abordar um grupo de bruxas.
Levantei-me e chamei por elas. Sem uma palavra, transformaram-se de novo em fogos-fátuos e voaram até à acrópole, onde me rodearam. Depois, voltaram à forma humana.
- Quem és tu? - perguntou o homem. - N?o me digas que és algum bruxo que também nos quer enfrentar.
- N?o, n?o - respondi prontamente.
Contei-lhes, ent?o, sobre a minha busca pelas Bruxas da Noite e o que me tinha levado ali.
- Sabes, nós também estamos muito interessadas nas Bruxas da Noite. Ninguém sabe quem elas s?o, o que querem ou de onde vieram. Isso torna-as perigosas para nós.
- Sabem onde as posso encontrar?
- Infelizmente, n?o - respondeu a outra mulher. - Se soubéssemos, já tínhamos falado com elas. Gostamos sempre de tentar convencer todas as bruxas e utilizadores de magia do Norte a juntarem-se ao nosso Grande Conventículo.
- Vem connosco - disse a primeira mulher. - Vamos mostrar-te o que temos sobre as Bruxas da Noite. Talvez se combinarmos os nossos conhecimentos, possamos descobrir alguma coisa.
- Acham que devíamos mostrar-lhe o esconderijo? - perguntou o homem.
- Ele já lidou com bruxas antes. Sabe que se disser alguma coisa a alguém, podemos p?r uma maldi??o nele e em todos o que ama - respondeu a primeira mulher. - Além disso, toda a gente sabe que estamos aqui na citania e que o nosso esconderijo n?o deve ficar longe.
Elas levaram-me, ent?o, até uma das casas castrenses reconstruídas. O homem tirou uma chave do bolso, que usou para abrir a porta, e entrámos. Lá dentro estava escuro. A única luz era a pálida luminescência da Lua e das estrelas que entrava pela porta, contudo, era suficiente para eu perceber que o local se encontrava vazio.
Enquanto me perguntava porque me haviam levado ali, uma das mulheres apartou um pouco da palha que cobria o ch?o e levantou uma pequena laje de pedra. Para minha surpresa, debaixo dela, encontrava-se um pequeno teclado numérico retro iluminado. A bruxa introduziu um código numérico e o ch?o come?ou a estremecer.
- Recua um pouco - disse o homem, puxando-me para trás pelo ombro.
Uma parte do ch?o baixou-se e deslizou para o lado, revelando umas escadas metálicas que desciam, na vertical, até um túnel em cimento. A mulher que abriu o al?ap?o desceu primeiro, seguida pelo homem. Eu fui o terceiro, enquanto a última bruxa ficou para trás, para fechar o al?ap?o.
O túnel estava bem iluminado e era curto, desembocando menos de dois metros depois numa sala bem mais espa?osa do que a casa reconstruída acima.
Era um lugar estranho. Como o túnel, tinha paredes de cimento, dando-lhe um aspeto de bunker. Secretárias com computadores e tablets misturavam-se com bancas onde repousavam almofarizes, facas, foices e frascos e vasilhas com múltiplos líquidos de diversas cores. Molhos de ervas diferentes pendiam, por fios, do teto, assim como patas de galinha e sacos de rede com ossos. Nas paredes, viam-se recortes de jornais e fotos de pessoas, algumas das quais reconheci como sendo intervenientes na política nacional e internacional.
Exatamente o que aquelas bruxas faziam ali, n?o sei dizer, mas era óbvio que eram mais poderosas e influentes que as de qualquer outro conventículo que eu havia encontrado antes.
Uma das mulheres ligou um dos computadores e come?ou a mostrar-me vídeos onde figuravam as Bruxas da Noite. Confesso que fiquei surpreso, assustado até, com todos os locais onde aquelas bruxas tinham olhos. Vi imagens das Bruxas da Noite nas montanhas do Gerês, nas ruas do Porto, sobrevoando o rio Lima, até nos túneis escondidos debaixo de Braga. Inclusive, mostraram-me um vídeo do meu encontro com uma das Bruxas da Noite, quando persegui um dos tragos sob seu comando. Eram imagens captadas do exterior da casa abandonada onde a encontrei, certamente por um drone. Infelizmente, a máquina n?o foi rápida o suficiente para seguir a criatura encapu?ada até ao seu esconderijo.
Apesar dos vídeos revelarem vários sítios onde as Bruxas da Noite tinham estado, mesmo somados ao conhecimento que eu havia obtido durante a minha busca, n?o ajudavam a descortinar os motivos ou o paradeiro delas. De facto, trouxeram ainda mais perguntas.
Sem mais nada que fazer ali, despedi-me das bruxas. Após reiterarem as suas amea?as do que me aconteceria se revelasse a alguém o seu esconderijo, deixaram-me ir.
No regresso a casa, n?o consegui deixar de pensar que estava cada vez mais confuso. Quanto mais sabia sobre as Bruxas da Noite, menos compreendia. Alguma vez iria encontrá-las e fazê-las responder pelas mortes que haviam causado?