Liberdade... como posso ser livre quando minha alma está presa em seus olhos? For?ar os deuses a tirá-la de mim, apesar de estar ciente do vazio imenso que carregarei e do medo que me tomará sempre que, sem perceber, procurar sua lembran?a que vive em mim.
I
Uivo levantou a cabe?a e sorriu para a bela manira que o puxou para o lado.
- Preciso de você, Uivo.
- é??? E para que, Elliara?
- Eu tenho uma miss?o, e gostaria que fosse comigo. Sei que está livre, que n?o está integrado em nenhuma equipe. Será uma miss?o de ca?a, de curto tempo.
- Sabe por que estou livre, n?o sabe? Acho que n?o gostam muito do meu jeito.
- Você está falando da comitiva de Adanu?
- Também...
- Ora, ouvi por aí que te convidaram, e que foi você que rejeitou...
- Sei bem onde n?o sou bem-vindo – sorriu triste.
- Que bom para mim, ent?o. Eles n?o te veem como eu te vejo. Ent?o, que tal?
Uivo virou o rosto e examinou a pequena triga comandada pela manira, que conversava ao lado.
- Qual sua miss?o?
- Só ca?ada... Tem uns infiltrados mais pelo sudoeste.
Uivo examinou novamente a triga. Além de Elliara havia três sedenerás, duas maniras, três lobisomens de aspecto ferozes e um caipora, que reconheceu ser Lavareda. Uivo o examinou. Lavareda o olhou por alguns segundos e deixou escapar um sorriso de deboche.
> Espero que a presen?a de Lavareda n?o o impe?a de vir comigo.
Uivo deu de ombros.
- Ele n?o é importante. Quando partem?
- Dentro de três dias...
- Vou pensar – falou, vendo Allenda se aproximar da triga. – Tenho algumas coisas ainda para fazer.
- é mesmo? – estranhou Elliara. – O que você tem que fazer? – perguntou após um breve cumprimento de cabe?a para Allenda, que se aproximou do caipora.
- Um grupo de bonecos foi avistado mais ao norte. Vou até lá... é só investigar e relatar.
- E quem mais vai com você?
- Ninguém, só eu! – retribuiu o cumprimento de cabe?a de Allenda, que voltara a conversar com o caipora. Elliara sorriu de leve, percebendo satisfeita que havia uma certa tens?o entre os dois.
- Entendo... Olha, Uivo, n?o tenho nada para fazer até a partida. Posso te acompanhar?
Uivo a observou atentamente.
- Acho que n?o deve, Elliara. A miss?o vai ser rápida, e vou voltar bem depressa.
- Ora, ent?o é melhor ainda. N?o quer a minha companhia?
- Sabe que n?o é isso. Apenas que é uma miss?o boba. Volto depressa.
Elliara o observou com muito cuidado.
- O grupo desses invasores é grande, Uivo?
- Isso n?o é importante – falou. – Eu devo ir agora...
- N?o, espere. Eu quero te acompanhar. Se há receio em me expor, ent?o podemos levar meu grupo. Que tal?
- Elliara... Eu preciso ir. Te procuro quando voltar – por mais que tenha tentado, a voz saiu dura e fria.
- Se voltar, n?o é mesmo, Uivo? O que está escondendo? Me deixe te ajudar, me aceite...
- N?o estou te afastando, Elliara. Apenas tenho essa miss?o...
- Você está me afastando sim, Uivo. Mas, tudo bem. Quanto a esse grupo, e se for um grupo grande? E, como te conhe?o, sei que n?o se contentaria em apenas investigar. Você até pode ser morto lá, sozinho. Existe esse risco, n?o existe?
- Isso n?o vai acontecer. A gente se encontra depois – falou dando por encerrada a conversa, se preparando para ir, incomodado ao perceber que Allenda e vários do grupo de Elliara estavam atentos à conversa.
- Espere, espere! Tá, tá bom. Ent?o nada de ir com o meu grupo, está bem? Podemos ir somente eu e você... – a manira sorriu.
Uivo inspirou forte, vendo aquele rosto luminoso. Como poderia dizer n?o?
- Está bem, está bem – desistiu. – Somente nós dois.
– Combinado. Mas, se forem muitos...
- Se forem muitos, você volta e chama os seus – capitulou.
- Se isso acontecer, se eu voltar para buscar ajuda, promete que vai ficar lá, esperando, só seguindo eles?
- Prometo... Agora, que tal...
- Me desculpem. Mas eu ouvi a conversa de vocês, e a oferta de Elliara. Eu gostaria de ir com vocês – se ofereceu Lavareda se aproximando ao lado de Allenda. - Seria bom para me manter ativo – falou, os olhos cínicos postos em Uivo.
Uivo o observou cuidadosamente. Sentiu-se incomodado. Havia um indício de sorriso no canto da boca, de que n?o gostou muito.
- Há outras formas de se manter ativo, caipora – falou, a voz ácida.
- Sei que há – sorriu Lavareda cínico. – Mas essa sua miss?o rápida também parece ser bem interessante.
- é um exagero irmos todos – recha?ou novamente, a voz seca.
- N?o, n?o acho – contestou Allenda. - Sei da sua miss?o, e dizem que lá n?o será t?o fácil.
- De quantos estamos falando, Allenda?
- Uns quinze invasores, Elliara – revelou. - Você foi aconselhado a ir acompanhado – falou para Uivo, - mas se recusou, o que eu acho temerário. Eu gostaria de ir junto também.
Uivo ficou em silêncio, o cora??o pesado e angustiado.
- Ora, por que acha que ninguém iria querer a sua companhia? – Lavareda sorriu. – Por que já partiu para: eu vou sozinho mesmo?
- Por que n?o cala a boca, Lavareda? Sei de suas rusgas, e ela n?o deve acontecer aqui, entendeu bem?
- Ah, está certo, Elliara. Para mim n?o houve problema algum – falou Lavareda.
- Você ouviu bem o que eu disse, Lavareda? – Elliara insistiu.
- Já disse que sim, Elliara.
- Que bom. Para você está tudo bem, Uivo? – perguntou com a voz suave, o que fez Allenda se for?ar a manter o olhar indiferente.
- Já disse que ele n?o tem qualquer importancia. Por mim... Mas, é muita gente – Uivo reclamou teimoso. – A miss?o é muito simples.
- Com medo de n?o dar conta? – debochou Lavareda. – Sem audiência, é isso?
Uivo se virou e o encarou, a face dura e silenciosa.
- Lavareda – Elliara o olhou com repreens?o.
- é brincadeira, Uivo – sorriu Lavareda se desculpando. – Sei que você é um bom guerreiro, ainda mais quando ataca de surpresa – sorriu novamente. - Eu insisto em ir.
Uivo o encarou de vez. Ent?o se voltou para Allenda, medindo sua rea??o. Uivo a viu desconfortável, percebendo que Lavareda iria ter sérios problemas num futuro n?o muito distante.
- Vocês podem se controlar? – Elliara perguntou para Uivo e Lavareda, voltando depois os olhos para Allenda.
- Eu estou tranquilo – sussurrou Uivo. – Mas, se for difícil para você, caipora, estou sempre por aqui.
- é, vai ser bom, n?o vai? – riu Lavareda. – Ent?o, quando vamos?
- Isso tomou um vulto estranho – reclamou Elliara. – Uivo, você decide: só eu e você, ou eles podem ir?
- Só eu e você, Elliara. E nosso acordo está de pé, se a miss?o se mostrar maior...
- Ela é maior, Uivo – reclamou Allenda. – Há relato de sombras, vários deles...
Uivo deixou a cabe?a cair, a raiva amea?ando turvar suas emo??es. Ent?o, respirou fundo, se tranquilizando. Levantou os olhos.
- Isso n?o é problema seu, filha de Adanu – falou bem lentamente, a tens?o aumentando nitidamente.
- Vai arriscar? – Allenda perguntou diretamente para Elliara.
Uivo fechou os olhos por algum momento. Ent?o, respirou fundo.
- Está bem, está bem. Vejo que n?o v?o desistir. Se querem ir, ent?o por mim, tudo bem – concordou sem qualquer emo??o, os olhos sérios em Lavareda, que fez que n?o notou.
- Quando partimos? – perguntou a manira, olhando com repreens?o para Allenda e Lavareda.
- Eu já estava de partida – revelou Uivo, sério.
- Me dá uma hora? – Elliara pediu. – Preciso avisar meu comandante e fazer alguns preparativos.
- E eu, o conselho – solicitou Allenda.
- Uma hora ent?o – aceitou Uivo.
II
Os quatro se embrenharam nas florestas das montanhas do norte. A neblina era espessa e até mesmo opressiva. Já tinham avan?ado bastante quando deram com uma face rochosa onde cascavéis se esquentavam.
O grupo decidiu dar uma parada.
- Por que me evita? – Lavareda sussurrou para Allenda, ajeitando-se ao seu lado. – Já faz um bom tempo que está me evitando. Sinto que está procurando uma discuss?o...
- Você está procurando confus?o com Uivo...
- Ele me atacou de surpresa...
- Primeiro, ele n?o te atacou de surpresa. Você estava correndo contra ele, ent?o já estava preparado para combatê-lo. Ele te venceu, e é só isso.
Lavareda a observou irritado, o rosto se avermelhando.
- Ele a estava atacando...
- Isso é entre mim e ele...
- Ah, entendi... – falou após estudar por alguns segundos o rosto sério de Allenda.
- Olha, Lavareda, a miss?o é importante. Sabe como sou quando estou em miss?o.
- Acho que n?o é isso, n?o é mesmo? – resmungou. – N?o é só por causa desta miss?o.
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- O que acha que é? – estranhou ela, libertando seu bra?o da pegada do caipora.
- Esse nefelin... Você fica estranha quando ele está perto.
- Você está vendo coisas. Além disso, eu n?o preciso te dar satisfa??o de qualquer coisa que diga respeito a mim. Entendeu?
O caipora a examinou e sorriu condescendente, vendo Allenda se afastar, o rosto sério e um pouco enfezado.
Em silêncio Allenda se sentou num canto, o rosto baixo, pensativo. Ent?o, ao ver a manira se afastar de Uivo se levantou decidida, sob o olhar curioso do caipora.
- Uivo, preciso conversar com você – ela pediu, postando-se à sua frente.
- Pois n?o, conselheira. Sente-se – convidou, indicando um lugar ao seu lado na pedra. – Precisa de algo?
- Sim, eu preciso. Primeiro, quero que me explique. Você foi orientado a vir acompanhado, e você se preparava para vir sozinho.
- Conselheira, também isso foi deixado ao meu critério. Se lembra?
Allenda observou Uivo, uma dor pulsando em seu cora??o. Como tocar aquele cora??o, que já estivera t?o perto?
- Ah, Uivo, você está me evitando, e sendo muito seco. Eu, eu...
- Allenda, está tudo como deveria estar. O que te incomoda?
- Me incomoda? Você n?o fala comigo, me evita... Muito educado, mas,... Parece que foge de mim.
- Impress?o sua...
- N?o, n?o é... Sei que você se recusou a se juntar à comitiva de Adanu, apesar da insistência dele e do humano,... de Tenebe – ela corrigiu. – E soube que pensava em partir, nos deixar. Por quê?
- Novos ares?
- Só por algum tempo? – perguntou, a voz se mostrando dolorida.
- O tempo é algo relativo... Em algumas ocasi?es, quando se parte n?o se dá um tempo de retorno.
- Iria mesmo embora?
- E isso te importa, flor-do-mato? – perguntou, a voz indiferente. – N?o deixe isso ocupar seus pensamentos.
- é por minha causa?
Uivo baixou a cabe?a, pensativo.
> Olha, sei que n?o nos demos bem no início, mas isso passou. Nós nos ajudamos em muitas ocasi?es e...
- Sim, nos ajudamos... Mas,... – falou se levantando – longe de mim querer impor minha presen?a. Sei que a deixo desconfortável, e n?o só a você. A comitiva tem reservas quanto a mim, e ent?o, também tenho quanto a ela. Sei que eu n?o seria uma boa escolha para a comitiva, pois n?o tenho lá muita serventia. Além disso, a comitiva para mim seria um estorvo. Fique em paz, Allenda, filha de Adanu, e cuide de seu namorado, porque ele está meio... brasinha – sorriu, apontando discretamente para o caipora que os olhava fixamente, enquanto se afastava, atendendo a um sinal de Elliara.
Allenda seguiu seus movimentos, a tristeza tomando conta de seu semblante. Ent?o ele ouvira o que ela dissera para Adanu, cismou abatida. Saber disso aumentava um pouco mais a dor no peito. Com tristeza sentir um gosto amargo na boca. Nem sabia ao certo porque dissera aquilo, que n?o seria uma boa coisa deixar aquele nefelin fazer parte da comitiva, porque o julgava sem serventia para uma miss?o como aquela. Se arrependia de ter dito isso, ainda mais quando sabia que isso n?o era verdade. Já vira inúmeras vezes o valor dele. Mas, como andar perto dele, se ele fosse? Como deixar os outros perceberem toda a dor que a presen?a dele lhe causava? Por que se sentia t?o insegura perto dele?, sofreu. Por que n?o dissera que seria uma boa escolha? Raiva e frustra??o, viu, o arrependimento doendo fundo.
Levantou os olhos e viu as m?os da manira no bra?o de Uivo, e a forma como ela estava suavemente dobrada na dire??o dele. Sua dor aumentou um pouco mais.
Se assustou quando sentiu o toque em seu bra?o. Voltou os olhos e deu de cara com a face séria do caipora.
- Agora vai dizer que n?o fica estranha perto dele?
- Quem você pensa que é? O que você julga que é para mim? – se levantou irritada, o sussurro entre dentes.
- Nós estamos juntos... Eu exijo...
- Você nada pode exigir de mim. Me aproximo e me afasto quando quero. Você nada é para mim – rilhou controlando suas tatus para n?o se denunciar. – Nada devo a você. Nada!!! Estivemos juntos, só isso.
Sem dizer mais nada se afastou, se esfor?ando em aparentar calma e frieza. Em silêncio sentou perto de ArrancaToco. Encostou sua cabe?a na dele e deixou sua mente flutuar, apesar de permanecer atenta ao redor.
Subitamente se levantou e abriu os olhos, vendo que todos estavam alertas.
Voltou os olhos para a esquerda, e viu mantas surgindo bem além, sobre o topo da montanha, descendo a encosta.
- Vamos – ouviu Uivo comandar, apontando para a direita. – Podemos interceptá-los quase que no meio da montanha.
- Devem ser uns dezesseis – sussurrou o caipora. – Dez que comandam e seis bonecos.
- Também acho – concordou Uivo se poderando, a cara séria absorta nos mantas que vagavam à frente, aguardando Elliara se posicionar ao seu lado.
Em silêncio progrediram.
Uivo assentiu quando a manira apontou para uma área mais rala de árvores, um bom local para emboscar os mantas e os bonecos.
Os quatro se espalharam, aguardando.
Lentamente os sons de mato sendo pisados e afastados foram se avolumando enquanto se aproximavam.
Assim que o último deles se mostrou Uivo se lan?ou, cravando com for?a suas garras no manta, que urrou de surpresa e dor. Sem esperar que ele caísse, Uivo se impulsionou e colheu mais dois deles, bem próximos um do outro.
A manira atingiu um manta que se lan?ava contra Uivo enquanto, com um galeio num galho, passou ao lado de outro, que atingiu entre os olhos enquanto caia em dire??o a uma outra árvore.
- à sua direita – Uivo alertou Lavareda enquanto caia sobre um manta que se posicionava entre as folhas, buscando surpreender Allenda.
O caipora enterrou um bra?o de fogo nas entranhas de um manta enquanto com a outra m?o segurava e queimava a garganta de um boneco.
- N?oooo!!!
Todos se viraram ao grito de Allenda, que corria desesperada na dire??o de Uivo, que estava sendo atacado simultaneamente por três mantas.
A manira chegou primeiro, a faca rasgando apressada os mantas que se enrolavam em Uivo, que rasgava e lutava em fúria por sua vez.
Arfando, Uivo ajoelhou, os três últimos mantas se contorcendo no ch?o.
A manira se aproximou e se ajoelhou ao seu lado, abra?ando-o preocupada. Allenda ficou parada, observando. Sem jeito se virou, examinando o entorno.
- Est?o mortos, e n?o há outros aqui – Allenda avisou. - Os bonecos também est?o mortos – avisou, a voz monótona e sem brilho, vendo Lavareda dar cabo do último boneco, que empurrou para o fundo do precipício, onde ficou como uma bola de fogo.
- Acho que a miss?o aqui acabou – falou a manira.
- N?o falei que ia ser uma miss?o simples?
- N?o para um, Uivo – repreendeu Elliara. - Como você está se sentindo? – perguntou, os olhos estudando a face de Uivo.
- Bem melhor. Obrigado, Elliara – agradeceu Uivo, se recompondo. – E, obrigado a vocês – Uivo se virou para Allenda e Lavareda, que estavam quietos, observando os dois.
- Tudo bem... – falou Lavareda.
- Foi um prazer – sussurrou Allenda.
- Também agrade?o. Vocês lutaram muito, muito bem. Você é muito boa, Allenda – Elliara elogiou. - E você, Uivo, é mesmo tudo o que dizem: um guerreiro e tanto. Renovo meu convite para que se junte ao meu grupo. Sabe, miss?o para o sudoeste, curta, provavelmente de uns dez dias... Você vem comigo?
Uivo suspirou fundo. Observou, de esguelha, que aquela ideia parecia n?o agradar muito a Lavareda.
- Está bem, Elliara. Eu vou! Será um prazer.
- E você também, n?o é, Elliara? – Lavareda convidou Allenda.
- Claro que sim, você também Allenda. Se quiser, será um prazer, se puder nos acompanhar.
- Ah, h????... Obrigada, Elliara, pelo convite. Eu vou pensar, mas acho que vai ser difícil. Sabe, a comitiva. Nós temos muita coisa para acertar. N?o devemos demorar para partir... Vou ver com eles... Mas, sim, eu gostaria de ir – falou por fim, as m?os segurando com for?a o fundo da aljava, presa às costas, a outra m?o batendo de leve na coxa.
- Isso, veja com eles... – incentivou Lavareda. – Seria bom ter você conosco.
Allenda o observou, o rosto sério. Virou o rosto, encarando Elliara e Uivo.
- N?o prometo, mas vamos ver. Se der, eu gostaria de ir sim...
III
O dia nasceu aninhado em neblinas espessas e lentas, se enrodilhando nas árvores e montes. O frio parecia ter sempre feito parte dela. Uivo observou os vultos sugeridos das árvores em meio ao branco opaco, e sentiu uma grande solid?o. Havia um vazio rondando sua alma, e era algo que n?o gostava de ficar encarando.
Uma dor fina surgiu ao ouvir Allenda se aproximando. Rápido se focou em Elliara que passava ao lado, e se sentiu bem melhor. Havia um calor ali, no sorriso que ela lhe endere?ou.
Sorriu ao ver Elliara se afastar e interceptar Allenda no caminho.
- Que bom que p?de vir – Elliara agradeceu, se dirigindo para Allenda.
Allenda rodou os olhos pelo acampamento, e cumprimentou Lavareda com secura. Elliara notou os olhos dela parando um momento sobre Uivo, e sorriu meio sem-jeito.
Uivo estava distraído, conversando com as outras pessoas da equipe, que pareciam muito interessadas. Os feitos de Uivo e sua maneira reservada tinham um bom efeito sobre o grupo.
Lavareda se aproximou deles, entrando na conversa. Após um mal-estar inicial o grupo se entrosou novamente, apesar de Elliara notar que Uivo evitava algum contato melhor com o caipora, desconsiderando algumas perguntas ou referências do namorado de Allenda, apesar das notícias de que os dois haviam rompido.
Devagar tomou Allenda pelo bra?o e a levou para o grupo, tomando lugar bem ao lado de Uivo.
- Que bom que já estamos todos aqui. Esta é Allenda – apresentou-a para a equipe. – Allenda também irá conosco nessa miss?o. Sei que as apresenta??es s?o desnecessárias, porque vocês todos já devem conhecê-la. Bem, o grupo que perseguimos é um grupo estranho, de seres estranhos com poderes estranhos – Elliara come?ou a apresenta??o. – Eles vêm tocando terror desde o oeste enquanto se dirigem para o sul. S?o em torno de 50 indivíduos, e eles est?o tomando caminhos anteriormente abertos, que os nossos ainda n?o conseguiram fechar. Temos que fechar esse caminho.
- E como o fecharemos? – quis saber uma das sedenerás.
- Com o sangue deles. Eles est?o a dois dias de corrida. Vocês est?o prontos? – perguntou.
- Ei... – ouviu-se um urro forte e poderoso vindo do acampamento.
Era um cainamé, e vinha com ares furiosos, os olhos presos em Uivo.
Uivo se levantou e afastou Elliara com delicadeza quando ela se posicionou ao seu lado, os olhos acompanhando o dem?nio.
> Você está partindo com essa gente? E a nossa miss?o, felpudo?
- Vou em outra miss?o... – falou Uivo, ficando definitivamente de frente para o dem?nio, que parou encarando-o com ódio e desprezo.
- Você n?o pediu permiss?o. N?o é você que escolhe as miss?es...
- Ele está comigo, vai me acompanhar. O conselho sabe – adiantou-se Elliara.
- Mas eu n?o sei disso, eu n?o fui informado.
- Isso n?o é um problema para mim – desafiou Uivo. – Mas para você parece que sim, n?o é mesmo? Você procurou se proteger bastante para vir conversar comigo – observou o peito estufado de folhas do dem?nio. - Espera problema?
- Você vai ser um problema?
- Se a minha vontade é um problema para você... – Uivo sorriu.
- Cunderah – ouviram um chamado poderoso vindo ao encontro deles.
Era Adanu que vinha apressado, montado em FuraTerra.
> Cunderah, Uivo tem nossa permiss?o. Você foi avisado disso – falou parando em frente ao dem?nio, sem desmontar.
- N?o estou sabendo, e ele n?o falou comigo... – falou irritado, sem tirar os olhos vidrados e raivosos de Uivo.
- Um pássaro do conselho está tentando te contatar há algum tempo – Adanu sorriu condescendente.
- Ah, certo! é que eu estava... Está bem, ent?o. Você tem a minha permiss?o, Uivo – aceitou, se virando e se afastando, sob o olhar indiferente de Uivo.
- Ora, e eu precisava dela? – falou Uivo, a voz séria.
O dem?nio parou, claramente indeciso de qual rea??o deveria tomar. Ent?o se virou e encarou Uivo.
- Sou seu chefe imediato e...
- Enquanto eu aceitar assim. E o momento para isso é meu.
- Uivo, Uivo, você e sua mania de n?o aceitar ordens – admoestou Adanu. - Vamos, Cunderah. Há muitas providências que devemos tomar – falou, puxando o dem?nio pelo bra?o, que se deixou levar.
Cunderah parou e suspirou, olhando com repreens?o para Adanu. Devagar se virou para Uivo.
- N?o o quero em meu grupo, Felpudo. Arrume outro lugar para aquietar sua raiva e as mágoas que carrega.
- Assim será feito – concordou Uivo.
- Vá com o Trov?o, e vocês também – se despediu, tomando o caminho ao lado de Adanu.
- Bem – Elliara sorriu por sua vez, agradecendo a interven??o de Adanu, que se afastava lentamente na companhia do dem?nio, - já que está tudo acertado, está na hora de irmos.
IV
Allenda se ajeitou ao lado de Lavareda, que a observou com cuidado. Por fim, sorriu e segurou sua m?o.
- Você é uma guerreira temível, e uma mulher... estonteante. Te respeito muito, mas n?o fa?a isso com você, muito menos comigo. Nós passamos do momento de fervura, e estamos em terreno muito perigoso, ao menos para mim.
- Me rejeitando, caipora? Muito gentil... – sussurrou.
- Nos preservando... Uma nova tentativa n?o passará nem de alguns minutos – sorriu.
Ent?o levantou os olhos e postou sobre Uivo e Elliara, que riam e se divertiam à sombra de uma castanheira. Eles se davam muito bem, reconheceu. E era essa a medida da dor de Allenda. Podia sentir a dor dela, espessa, envolvendo-a. E ele n?o era o único a ver isso. Com exce??o de Uivo, que aparentemente n?o queria ver, os outros todos percebiam.
> N?o é a mim que seu cora??o deseja...
- Quem seria ent?o? – gemeu.
- Aceite, e poderá ent?o lutar. Você já viveu muitos e muitos anos, mas nunca aprendeu sobre amar, n?o é mesmo? Aceite essa nova li??o, e poderá lutar – repetiu se levantando, deixando-a com os olhos presos em suas costas enquanto se afastava para a companhia dos outros.
Allenda virou a face, passando-a por Uivo e Elliara, e sentiu um baque que a desnorteou. Ali estava sua dor, reconheceu claramente. Com furor se levantou, lutando para rejeitar o que o nefelin a fazia sentir.
Bufando se enfiou no mato, no entorno do acampamento. Seu cora??o estava em fogo, sua alma parecendo perdida. Com for?a se ajoelhou e abra?ou a cabe?a de ArrancaToco, o que lhe trouxe um pouco de alivio.
Estavam a um dia de corrida acelerada do grupo de invasores, e aquele era o momento de recuperarem as energias. Levantou os olhos para o azul do dia que podia ver por entre as copas. Devagar subiu um pequeno monte, onde ficou em silêncio, pensando.
Ent?o eles apareceram, e ela se encolheu, temendo ser vista.
Uivo e Elliara pararam numa parte rala da mata e se abra?aram.
Allenda sufocou um grunhido. Apoiou a m?o sobre ArrancaToco, fazendo-o se aquietar.
Fechou os olhos com for?a e chorou, a dor amea?ando arrebentar seu cora??o.
Quando abriu os olhos os dois estavam nus, e pareciam felizes.
- Aceitar e lutar, ent?o – repetiu para si mesma, lutando para ignorar a dor que a sangrava, enquanto se esgueirava silenciosamente pelo outro lado do monte.
V
- O que você está fazendo? – Elliara gritou para Allenda, se colocando ao seu lado.
- Por que? – Allenda gritou de volta, arrancando com for?a a seta da cabe?a do thianahu.
- Você está lutando com uma fúria terrível, se arriscando demais.
- é assim que luto minhas batalhas – grunhiu tomada de furor.
- Lavareda – Elliara gritou, chamando o caipora para o seu lado, que acorreu depressa. – Controle sua namorada. Ela ainda vai colocar alguém do grupo em risco antes de se matar.
- Nós nada mais somos – gritou ele, se afastando. – Ela está por conta do grupo.
Elliara grunhiu, vendo Allenda dar cabo de outro thianahu. Após se esquivar de um ataque e rasgar a garganta de um thianahu procurou no campo de batalha, e achou Uivo, e seu cora??o se encheu. Ele estava no meio de três coloridos ariscos, e parecia bailar. Leve, ágil, perigoso. Os três n?o eram páreo para ele, sorriu.
Ent?o saltou e girou, disparando as flechas.
- Quase um quil?metro de batalha pela trilha, que conduzimos, encharcando todo o caminho com o sangue desses cretinos. Empurrando e matando, empurrando e matando. Acho que o caminho está fechado – sorriu.
Satisfeita deu um trinado alto e grave, enquanto atacava com redobrada fúria. Ent?o revogou a ordem de aliviar e matar devagar o grupo, para esticar a matan?a pelo caminho. Contente se poderou com toda a for?a, e como uma onda a matan?a deslanchou. Em pouco tempo nenhum inimigo mais pode ser encontrado.
VI
- Filha, o que aconteceu? – perguntou Adanu, a preocupa??o estampada na face.
- Apenas uma batalha, pai. Sabe como sou – falou tirando a aljava e colocando num gancho de galho da oca.
- Sim, eu sei como luta, e n?o é assim. Pelo que apurei você parecia querer... sei lá... Você parecia dar pouca importancia à própria vida...
- Isso n?o é verdade. Eu apenas estava...
- Eu sei, eu sei...
- O que sabe, pai? – Allenda o olhou com estranheza.
- Sei que deseja esquecer.
Adanu levantou a m?o, fazendo-a ficar em silêncio.
> Vi você quando chegou, e vi os pretendentes fazendo fila, quando souberam que você e Lavareda haviam rompido. E vi como os tratou, como se n?o existissem...
- N?o me interessam...
- Amar dói, filha. Amar dói demais... E n?o se engane... Mesmo quando estamos com quem amamos, a dor só tende a aumentar. Primeiro, há o medo do vazio de n?o ter, e depois, o medo de perder...
Allenda ficou em silêncio, pensativa.
- N?o quero isso, pai. é uma dor que machuca demais – sorriu triste para o pai.
- Eu sei, eu sei. Mas, infelizmente, n?o querer já n?o está mais em suas possibilidades. Porém, ao menos para mim é algo bom – sorriu abra?ando a filha.
- E por quê?
- Porque ele é nobre. Tenha paciência, tenha fé. Ele respeita a manira, mas o cora??o n?o está com ela.
- O cora??o dele está onde, ent?o?
- Ah, filha... Você esteve cega para o seu cora??o por muito tempo, em suas ca?adas, em suas andan?as, e ainda está cega para o cora??o dele. Tenha paciência, deixe-o esquecer a dor que ainda sente, anterior à sua dor...
- Mas, eu n?o sabia o que ele...
- Sabia sim, filha, mas seu medo a impediu de aceitar. De tempo ao tempo, deixe a ferida curar.
- E a minha ferida, pai? Devo deixar que ela só aumente, ent?o?