Foi num dia especial como todos os outros, que tudo o que eu havia sido feito e passado voltou com uma avalanche sobre mim. Eu gostaria de ter sido avisado, de ter sido preparado, apesar das vozes que me sussurravam quando eu olhava para o meu cora??o, do que eu havia sido.
Foi num dia de intensas chuvas, quando as serras e montanhas se mostraram brancas e esfuma?adas que os sinais se tornaram inquestionáveis.
Eram sinais fracos a princípio, que logo foram se mostrando mais fortes: o UM ficara descontente com a atua??o de muitos na guerra.
- Estive com Emanoel – contava Lázarus para os seus, que se mostravam sérios, dentro da cabana. – As coisas v?o ficar muito sérias.
- O UM?
- Sim... Eles receberam avisos...
- Há alguns humanos que receberam também, em sonhos – falou Valentina.
- E pessoas também. Elas est?o muito preocupadas. Parece que a felicidade abandonou este mundo – falou Sol, a voz abatida sob o olhar pesaroso de Avenon.
- Algum de vocês teve algum sinal, ou sonho? – perguntou.
Ante o silêncio ficou pensativo.
- O que dizem esses com quem conversaram?
- Rios caudalosos – falou Ariel. – Muitos rios, por toda Gaia.
- Canais sendo destruídos – contou Sol, - e destruindo todas as planta??es. Havia muitas pessoas e homens mortos boiando sobre os campos inundados.
- Uma mulher santa teve uma vis?o, que ela disse ser profética – falou Valentina. – Ela disse que viu altas montanhas sendo derretidas por águas que cobriam o mundo.
Lázarus ficou atento nessa profecia, e nos outros sinais que contaram.
- Algum outro sinal de que ficaram sabendo? – perguntou, a voz baixa e um pouco sufocada.
- Minha m?e contou que, perto da aldeia vive um xam?, um homem santo. Ele vive só, retirado no meio da floresta – falou Sol, os olhos perdidos além da porta da choupana, para a chuva forte que caia. – Ela disse que alguns dias atrás ele saiu da floresta gritando coisas estranhas e incompreensíveis sobre o fim do mundo, e que tínhamos que estar preparados, e que quem pudesse que juntasse muitos mantimentos e fizesse imensas pirogas. Ele disse que o Trov?o ia limpar o mundo de toda iniquidade, e que faria chover por quarenta dias sem qualquer intervalo, até que tudo morresse sob as águas. Ele estava como louco, gritando e falando para todos se penitenciarem. Quando chegaram perto dele ele simplesmente caiu morto, como se tivesse sido atravessado por uma flecha.
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- Por uma flecha – estranhou Lázarus. – Que tipo de flecha?
- Eles procuraram, mas n?o encontraram nenhuma.
Vendo que o silêncio perdurava, e que nada mais havia, Lázarus se deixou perdido, olhando para a chuva intensa que fustigava o mundo.
- O que essa flecha tem de importante, Lázarus? – quis saber Ariel.
- Parece que tentaram impedir que ele nos contasse isso – cismou, ainda atento à chuva que caia.
Por longas horas ficaram ali, em silêncio, ouvindo a chuva.
Foi com imenso alívio que a viram diminuir e ir embora, o céu azul se abrindo em toda sua majestade.
- Ent?o, n?o foi dessa vez – riu Avenon satisfeito, que logo ficou quieto vendo o olhar de reprova??o, e n?o só de Sol.
- Mas, ainda n?o entendi. O que tem essa flecha de especial, Lázarus? – quis saber Mulo, vendo que ele prestara muita aten??o nessa parte.
- Foi o que eu disse. Pode ser fobia, mas parece que alguém n?o quer que essa informa??o seja passada à frente. Isso dá credibilidade a esse xam?, e todas as vis?es que contaram. Ao que parece, o mundo, este mundo, está sendo levado para uma destrui??o pelas águas. Quarenta dias de uma chuva torrencial podem fazer isso com esse mundo.
- Se for isso que estiver para acontecer, há algo que podemos fazer? – perguntou Valentina.
- Ah, há sim. Fazer o que eles n?o querem que seja feito: espalhar a notícia. Além disso o xam? já nos apontou uma salva??o: as pirogas gigantes.
- O que foi, Lázarus? – se preocupou Ariel, sentando-se ao seu lado, segurando com delicadeza o seu bra?o. – Vejo que algo o está incomodando, e isso já há algum tempo. N?o quer me contar?
- Os drag?es – sussurrou.
- Sim?
- Desde o início das guerras eles, todos eles se afastaram e se mantiveram em silêncio em seus refúgios, e lá eles foram deixados em paz. Mas, isso n?o os protegeu. Eles sofreram demais – gemeu baixinho. – Tentei colocar uma aura de prote??o em torno de seus lugares, mas a energia das guerras as enfraqueciam e destruíam.
- Eles sabem que você se esfor?ou. Sei que eles s?o muito sensíveis ao planeta, e essa dor deve ter sido numa medida terrível demais. Sinto por eles. Há algo mais que descobriu, ou viu, que o abateu tanto assim?
- N?o sei, Ariel. N?o consigo ver com clareza. Apenas sinto um vazio no peito, como uma perda enorme demais. é como procurar algo que n?o está mais lá. E, quando penso assim, quando tento me focar nesse sentimento, sempre resvalo e me pego pensando nos drag?es.
- Teme por eles? Acha que algo vai acontecer com eles?
- N?o sei, sinceramente. N?o haverá puni??o contra eles, é logico, mas...
- Como eles est?o? Sentiu algo diferente neles?
- N?o, n?o há nada de diferente em suas auras, em suas energias. Mas, apenas est?o mais silenciosos, mais recolhidos. é como se estivessem esperando algo, mas, tal como nós, n?o sabem bem o que pode ser.
- Tem receio por eles? – Ariel insistiu.
- Como disse, n?o sei. Mas, certamente, temo por nós.